segunda-feira, 7 de novembro de 2016

O silêncio do amor



Eu não consigo elogiar as pessoas que eu mais amo. Tá certo que eu tenho uma certa dificuldade com o termo. Talvez nunca tenha de fato entendido aquela aula da terceira série quando a professora explicou a diferença entre coisas concretas x coisas abstratas. Ela deu exemplo da pedra. Foi fácil. Chutava várias, colecionava outras tantas. Podia tocar, senti-la, quebra-la admirá-la. Mas pro abstrato usou amor. Nunca compreendi bem.

 Duvidei, questionei, perdi horas do dia e noites em claro pensando sobre. Ainda tenho muitas dúvidas. Mas confesso que o abstrato, talvez pelas dúvidas, me encanta mais. Entre os mistérios e encantamentos, sigo tentando entender. 

Não sou de distribuir "eu te amo" por aí. Guardo, como algo precioso, diferente do que as propagandas ou livros de auto ajuda pedem. Desobedeço. Já passei por várias situações constrangedoras de ouvir um "eu te amo" e não me enganar dizendo um "eu também".

Mas não quero entender isso como falta de amor. Entendo como um respeito absurdo a esse sentimento. Distribuo elogios na medida que meu rigor permite. Elogiar é fundamental, com o cuidado que eles sejam significativos. Não vejo como mecânico ou matemático, mas a magia da vida se encarrega de exercitar meu olhar e enxergar sempre muita coisa para elogiar.(falei sobre isso nos textos anteriores).

Recebo tantos elogios a mais do que merecia que cuido para não menospreza-los ou me enganar. Mas os que mais gosto são os inesperados, em forma de atitudes. Costumo dizer que não me peçam elogios, arranque-os de mim. Também não me elogie de volta ao eu te elogiar. Nada que me pareça mecânico, por favor!

Mas confesso que estou até agora só enrolando e não escrevi sobre o que queria. Me propus a um ato de coragem. Confesso: Não consigo elogiar as pessoas que mais amo. Não lembro de ter ouvido alguma vez meu pai ter me dito um "eu te amo". E estou longe de pensar que ele não me ama. Inclusive além de admirar, aprendi e muitas vezes reproduzo o seu comportamento de dizer eu te amo através de atitudes. (ao menos é assim que o interpreto). Minha mãe também nunca foi muito dada aos "eu te amo". Em relações as atitudes não posso nem falar. As vezes chata e melosa de tanto "eu te amo" em atitudes :)

Mas hoje, reconheço ter herdado muito isso de expressar o amor através das ações, tanto quanto a admiração por esse comportamento. Mas também desenvolvi a vontade e reconhecimento da importância de completar essas atitudes com a boa e velha explicitação "eu te amo".

Tenho percebido que às vezes o amor também precisa ser explicado.

Tô exercitando. Pai, mãe, Júlia, eu amo vocês, muito. Nunca falei. Vocês provavelmente não lerão isso. Mas eu to treinando. Falo para todos de vocês, conto histórias e explico os motivos do amor. Mas para vocês, não.

Amo umas outras pessoa aí. Mas vamos por parte.

Por hora, já disse sobre orgulho. Sobre ficar nervoso ou não conseguir expressar direito.

Certa vez uma pessoa que me conhecia muito me perguntou "Ralph, o que é o amor?" Ele reforçou "Não quero que tu filosofe, nem cante, nem fale através de poemas ou algo do tipo". Parei. E prontamente falei para meu analista - Amar é gostar de estar com a pessoa. E conseguir ficar com ela em silêncio.

Nunca esqueci! Faz anos. Peno igual ainda.

Se eu fico em silêncio do teu lado. E gosto. Eu te amo. (mas não me pergunte.)

sábado, 22 de outubro de 2016

Kalunga: Um grito de Luta e Poesia.


     


    Kalunga é uma banda liderada pelo mestre Telmo Flores, traz músicas marcadamente críticas e com muito ritmo e consciência. Lançaram neste mês o disco "Na trilha e no ritmo do negro". Ganhei um exemplar do meu parceiro e guitarrista da banda, professor Matheus flores (Geo). Um cara que no palco ou na sala de aula dá seu recado e faz a sua parte. 

     Em 10 faixas os disco traz uma mistura de ritmos, poesia e engajamento. Com uma pluralidade de ritmos e celebrando a diversidade musical e social do Brasil, a banda mescla reggae com samba, rap, jogo, soul, candombe e ainda elementos do rock e pop. Tudo muito harmônico, empolgante e militante. 

     Versando sobre a cultura negra, desigualdade social, questões atuais e processos históricos, o disco é uma aula em sons e letras. Traz temas como violência policial, valorização do negro, exclusão social, tolerância, questão de gênero....

     Excelente pra ouvir na noite, tomando uma ceva, ou pela manhã, dando aula. Pra dançar, curtir, refletir, fica a dica! Um dos discos mais geniais que escutei nos últimos tempos. Desde as letras das excelentes composições, passando pelo ritmo pegado, melodias marcantes e muita harmonia. Muito bem gravado.  

     Nos vocais, além do Telmo, podemos ouvir a Cibele, Helen e Sabrina. Afinações e coros sempre de arrepiar. Nas cordas, além da guitarra marcante do Matheus Flores (que com Léo também assina os arranjos harmônicos), ouvimos as linhas de baixo do Léo e a guitarra e violão de Márcio e David. Na percursão, o time de respeito é formado por Cleoson, Jefe e Rafael. O cd traz ainda convidados: A Lua Barros, Nego Dener, Kacau Soares, Karrah, Leticia Mendes, Rafael Bruno, Gabriel luzzi, Mauricio Oliveira e Edu Nascimento. Também excelente a arte da capa, de responsabilidade do Bruno Ortiz e Christel Fank.Tudo muito bem gravado no comando de André Birck.

     Versos que você vai gravar. Vai cantar. Vai pensar. Um grito de luta e poesia.  Disco fantástico que deve ser conhecido. Necessário e maravilhoso. Ouça, dance, pense. Viva a cultura negra. Celebre a pluralidade. Mantenha a resistência! Grande Matheus! Dale Kalunga. 



ps: Na fotografia, o disco. Procure eles no Facebook, Youtube ou na rua. 

quarta-feira, 14 de setembro de 2016

Resultado de imagem para paraolimpíadas 2016


     Desculpe o transtorno, mas preciso falar de coisas boas. Peço perdão porque sei que o que nós humanos mais gostamos é de poder falar mal, reclamar e maldizer. Seja qual for o assunto, ele rende muito mais tempo e audiência quando é mais trágico do que positivo. Política? Ninguém presta, são todos corruptos, vamos falar das promessas não cumpridas, das suas falas erradas, ofensas e etc. Não há um único político que tenha feito ao menos uma ação positiva, parece. (se houver, citamos rapidamente para não perdermos tempo com coisas boas).

     Esse trimestre em uma turma pedi como trabalho um momento de inspiração política. (afim de pensarmos a política a partir de outro viés.) Curioso pela pesquisa que os estudantes teriam que fazer para além do senso comum, destacar propostas e ações positivas, fui decepciona com momentos de ditadura!(tanto de direita quanto esquerda) E ao questionar os estudantes o que eles tinham destacado de positivo, me respondiam que não era nada positivo, mas também não era tão ruim. Ou seja, parece mesmo que a questão está mais enraizada do que se pensa.

     Não é a toa que assunto que mais desperta interesse em sala de aula são os horrores do holocausto. Quanto mais falar das torturas do nazismo, mais interessados os estudantes se colocam. Aquele mesmo interesse sombrio que faz as pessoas pararem nas estradas para verem acidentes mas não para tirar fotos com arvores floridas. Nos whats apps circulam mais fotos de violência do que de pequenas belezas do cotidiano. A mídia explora muito mais assassinatos, estupros e crises do que gentilezas, boas ações, e atitudes positivas. Qual foi a última capa de jornal trazendo algo de melhoria? Será que não há coisas belas a se mostrar? No máximo aquelas reportagens curtas que pensamos ser brega por trazer algum exemplo positivo.

Se o assunto é relacionamento, prepare-se para a lista de reclamações dos parceiros(as). Também destacam-se o negativo de se estar com alguém ou então sem ninguém.

     O mesmo ocorre no discurso de que não há filme brasileiro que preste! Não há mais músicas boas como antigamente. Hoje a arte e cultura brasileira é descartável. Aliás, o Brasil mostra que o mundo nunca teve tão violento, intolerante e preconceituoso! Será mesmo? Esses discursos negativos do senso comum talvez mostrem que se você vê tudo assim, certamente o problema está em você! Apenas está externando o que está aí dentro!

     Deixe seu pessimismo para momentos melhores. Afinal, o mundo está piorando cada vez menos. Basta olhar, pensar e comparar. Mas tem que abandonar o ranço daquele que reclama mas não faz nada. Que tal se propor a falar mais do que está bom do que o que está mal a partir de hoje? Comece elogiando algo. Para quem possa achar que é alienação, digo: Alienação é não fazer e só falar. E poucas coisas são tão poderosas para a transformação quanto um elogio. Difícil?

Deixe abaixo um texto do Gregório Duvivier que versa sobre isso. Porque muita gente só conheceu ele pelo texto que para muitos é apenas uma jogada de marketing. (vale a leitura)




* Na fotografia uma imagem que representa um assunto que deveria ser mais tratado. Mas por que a mídia não troca um pouco as noticias negativas pra mostrar paraolimpiada mesmo? interesses...


terça-feira, 6 de setembro de 2016

Não persiga a felicidade! (isso pode deixar você não percebe-la)




Levo muito a sério os sonhos. Os meus e os dos outros. Falo sobre aqueles sonhos que temos acordados. Gosto de saber o que as pessoas sonham. É quase um “diz qual teu sonho que te direi quem és”.

Certo dia entrei pra uma aula e notei no fundo da sala um quadro com os sonhos dos meus estudantes. Adorei e corri para ler atentamente cada um. Para minha surpresa e certa decepção, a grande maioria tinha como sonho "ser feliz".

Não deveria ter me sentido assim. (surpreso). Explico: Que sonho das pessoas é ser feliz eu já deveria saber. Pesquisas, falas, entrevistas, comentários, atitudes (consumo, hipocrisia, violência, intolerância...) tudo isso demonstra que o que as pessoas mais perseguem hoje é a felicidade. E ai está a minha decepção.

Felicidade não é algo que se persegue, é algo que se tropeça.

Sem dúvidas que vivemos em um tempo onde a moda é a obrigação de ter que ser feliz. Quase como se fossemos os românticos do XIX ao contrário. E não estamos percebendo o quanto isso nos faz mal e nos impede de sonhar.

Isso de querer ser feliz é uma fabricação. Uma imposição econômica, politica e cultural que acaba por se tornar uma mentalidade fortemente marcante na sociedade moderna ocidental.
Não existe, tanto no ponto de vista teórico quanto prático uma lógica em que a felicidade é um ponto final. Algo que se consegue a partir de um esforço, como recompensa ou resultado de uma vida de trabalho, estudo ou sei lá... para se chegar ao final de tudo na felicidade. Definitivamente não é assim.
Felicidade é aquilo que acontece enquanto estamos distraído. Como diria um cantor brasileiro brega, o que existe na vida são momentos felizes. E se estamos preocupados em passar trabalho para alcançar a felicidade, ela passa e nós não notamos.

Muitos teóricos, filósofos, psicólogos , artistas se dedicam até hoje a pensar a felicidade. Mas ela é de sentir, não de pensar.  Fico com dois. Ou melhor, pego emprestado referências em dois pensadores para explicar o que é felicidade para mim.

1)      Epicuro, filósofo grego antigo. Felicidade é a ausência de dor (física e espiritual). Pra não sentir dor é necessário não ter desejo sem ser realizado, Logo, poucos desejos, vida simples é o mais próximo da felicidade.

2)      Fernando Pessoa, escritor português moderno, em um dos seus heterônimo diz que pode não ser nada, mas guarda dentro deles todos os sonhos do mundo. Ou seja, muitos sonhos (que não devem ser confundidos com desejos) mas que podem ser relacionados contraditoriamente a felicidade do Epicuro.


3)      Entre simplicidade e sonhos, buscando a ausência da dor física e espiritual, vou tropeçando na felicidade. As vezes ela está mais nítida, outras vezes mais embaçada. Em alguns momentos deixo de enxerga-la, mas logo exercito meu olhar em busca-la. Tem momentos que me afogo nela. Outros chego a sentir sede. Penso que é assim. Faz parte da vida e nossas escolhas e nossos sonhos são fundamentais. A felicidade depende da forma que olhamos pra eles. Não devem ser o produto final.




 * Na fotografia, minha afilhada seguindo seu caminho. Espero que não pensando em encontrar a felicidade no fim dele, mas topando com ela em meio as suas pegadas. 

sábado, 6 de agosto de 2016

Era uma vez... (Abertura da Olimpíadas no BR)

     

      Abertura das Olimpíadas no Brasil sem dúvida deu o que falar. Não somente em nosso país, mas figurou entre os principais veículos de comunicação do mundo todo. Brasileiros comemorando, sentindo-se orgulhosos e felizes. Alegria era marca das noticias, sempre trazidas com um tom emocionante sobre todas as virtudes do Brasil e dos brasileiros.

     Há uma semana não seria possível perceber isso. Mas e o que mudou? De um país corrupto, em crise, intolerante, onde nada funciona e todos querendo se mudar para esse orgulho todo? Política do pão e circo funciona desde a antiguidade. Nisso, Roma conseguiu se aproveitar como ninguém. A questão é que não é somente negativa a política do pão e circo. Afinal alimentar os que tem fome é algo bem importante. Nutrir o corpo e a alma. Certamente estávamos com fome. O Brasileiro precisava disso. Passamos por vexames esportivos, econômicos, políticos e sociais nos últimos anos.
    
    A festa então apaga tudo isso? De forma alguma. Ao menos não por mais de algumas horas. Mas a questão é que a festa pode fazer notarmos que nem tudo são problemas. Nem tudo está perdido. Ela ajuda a nos empoderarmos, sentirmos coragem e ânimo. Autoestima é fundamental para qualquer processo de mudança.

Representatividade indígena, reconhecimento da cultura negra, valorização da mulher, empatia com os refugiados e preocupação com problemas ambientais! Importante tocas nestes pontos? Sem dúvida. Foi bonito? Foi. Bem feito? Sim. Mas soou hipócrita? Claro!

Em um país que não conhece, reconhece ou valoriza seus povos nativos. Que continua a ignorar a diversidade e riqueza das variadas culturas indígenas brasileiras coloca-los como artistas principais e na realidade saber que eles não são nem figurantes... triste. Será que eles servem só pra figuração em nossas festas? Impressão minha ou ninguém foi contra cotas aos indígenas e negros para figuração na abertura das olimpíadas?

Ninguém foi contra os negros na dança de abertura? Aliás, nada de violência né? Em um país extremamente preconceituoso na questão étnica que disfarça seu racismo, foi legal fingir que o negro estava de fato incorporado a sociedade brasileira. Ou será que lá, dançando, bem longe da gente é bonito. Estavam a uma distancia segura.

Respeito a figura das mulheres! Certissimo. Mas define um país onde a partir da cultura do estupro a culpa é sempre delas. Onde ainda recebem consideravelmente menos que os homens, não possuem grande participação política e para muitos ainda são alvos das piadas de inferioridade.

Aplaudimos entusiasticamente o grupo dos refugiados? Exatamente como deveríamos. Mas e porque no dia a dia a gente tem medo destes terroristas? Afinal eles vem tirar nossos empregos, não é? Fechamos as portas para eles. Mas é que nas olimpiadas ficam só por um tempo e já vão embora. Para onde? Isso não importa.

E por fim demos um recado ao mundo sobre os problemas ambientais e a importância da sustentabilidade? Perfeito! Mas nós? Que não conseguimos nem despoluir as lagoas onde haverá competição? Que mal conseguimos separar o lixo?


Enfim, não quero ser o cara chato. Mas não quero ser o cara bobo. Entre eles talvez tenha uma linha tênue onde nos deveríamos tentar nos colocar. Nem ingênuos, tampouco neuróticos. Foi bonita, interessante, bem feita, tocou em temas importantes. Mas agora vamos fazer por onde né? Para que não seja só uma ficção. 




* Na fotografia é Lea T, modelo transexual, trazendo os atletas brasileiros. Na abertura uma linda homenagem à todo um grupo. Grupo esse que nos outros dias é alvo de violência, transfobia, piadas, agressões, intolerância e e exclusão. 

terça-feira, 19 de julho de 2016

Só palavras.

    

 O mundo é só palavra! A palavra é o que nos difere dos demais animais. A palavra é sagrada e cotidiana ao mesmo tempo. Do profano discurso intelectual ao ritual erudito de pedir pão na padaria. A palavra é a base da sociedade humana. Nós somos aquilo que as palavras dizem.

     Atualmente viemos assistindo o esvaziamento das palavras. Elas já não dizem, não são capazes de externar ou nós não as conseguimos mais vê-las. Distanciamo-nos. Toda palavra é por si ideológica. E através dos nossos discursos que construímos a realidade. Onde falta a palavra sobra a violência. 

  A guerra é a falta da palavra. O diálogo é o encontro. O encontro das palavras. Elas ficam contentes ao se encontrarem, vibram, festejam. Mas ultimamente tem andado tristes. Estão de luto. Não há mundo se não a partir das palavras. Não há o que mudar. Não há como mudar.
     A palavra é nossa principal arma na luta desta transformação. A palavra é a ferramenta básica não só para um professor, um artista, um comunicador, mas para tod@s. A palavra é a base para a construção de uma sociedade. Através dela mudamos.

   A arte de bem escrever, falar ou comunicar-se reside na escolha das palavras. Pensemos mais nelas. Façamos um carinho. Fiquemos quietinhos com elas, observando, pensando, lendo-as. Despindo-as demoradamente, para que possamos senti-las. Provar cada uma delas afim de que possamos ingeri-las. Saboreá-las. E com o gosto, o significa e o prazer, possamos compartilha-las.


     Pense mais e fale menos. Por respeito a palavra. Mas não a deixe presa. Por respeito a palavra. Use-a também sem a moderação, afogando-se nela. Mas também poupe-a como um bem raro. Confuso? Afinal, quem sou eu para me meter nas suas palavras. Faço apenas um pedido: Crie suas palavras para que elas transformem-se em ações. 

Depois me fale. Qual a sua palavra. 

segunda-feira, 20 de junho de 2016

Ele está de volta???

      


      Ele está de volta é um filme baseado no livro de mesmo nome, escrito pelo alemão Timur Vermes. A obra literária e sua adaptação para o cinema se propõem a pensar como seria se Adolf Hitler voltasse a vida nos dias de hoje. A ideia guarda um misto de originalidade e clichê. Sem dúvida que me instiga e pelo jeito, causa curiosidade em muita gente. (nas últimas semanas tem sido um dos filmes mais assistido no netflix; Também tenho visto muitos comentários da crítica).

      De uma forma mais leve, em tom de comédia para se assistir no domingo a tarde, o diretor vai nos revelando as ideias nazistas de Hitler ao mesmo tempo que vai costurando com entrevistas da população, que apoiam e defendem seus preceitos ainda hoje. Entre medo e risadas, o filme vai nos fazendo perceber que o contexto de fato é propicio a refletir que talvez ele não volte. Não volte porque ele nunca foi embora. Ele está dentro de todos nós!!!!

      Seja no instinto de defesa, no nosso egoísmo, na forma ingênua de pensar algumas questões complexas e acabar de forma intolerante fazendo o uso de algum tipo de violência para simplificar as coisas. A democracia, como já disse em outro texto aqui, não é fácil. Muito menos trabalhoso é uma ditadura. Obedecer quase sempre é mais fácil do que pensar.

      Nessas horas fica mais nítido enxergar que nenhum ditador se mantém no poder sozinho. Na teia das relações de poder, está a maioria da população o apoiando ou simplesmente não fazendo nada contra. Também fica claro o quanto a publicidade e as novas tecnologias seriam auxiliares a proposta e figura de um novo “Hitler”.

      Isso não é difícil. Quantos hitlers você possui no facebook, twitter, sala de aula, bairro, câmara ou senado? Curioso notar que no filme também, no inicio é pensado quase que de forma cômica. Chega ser engraçado de tão absurdo. Mas aos poucos a população, sempre em um contexto de alguma desmotivação, problemas, inseguranças, acaba comprando facilmente os discursos que apelam para nosso irracionalismo sentimental.
Sem querer dar spoiler, vale o destaque de como a pessoa que mais percebe a situação é tratada como louca, enquanto os demais apoiam todo o discurso de ódio que vai se instaurando.

      Em meio as polêmicas do lançamento do Minha Luta (já que agora, depois de 70 anos, os direitos autorais tornaram-se de domínio público) vale a reflexão, o que resta de Hitler dentro de você? Para muito além do controle do estado em questões polêmicas, o que me causa espanto nestas discussões é como ainda há tanta gente baixando, lendo, compartilhando e pensando/agindo com tais argumentos de intolerância étnica, social, sexual... É talvez estejamos todos exteriorizando o nosso lado doentio, em busca do que nos falta, essa febre indica que de fato estamos em uma sociedade doente. Isso é a febre...
(Basta ver políticos dos EUA ao Brasil e seus milhares de eleitores; As redes sociais e seus discursos de ódios sem embasamento nenhum; As entrevistas do filme; Os discursos reproduzidos por jovens em salas de aula... e basta fazer uma análise mais aprofundada, detalhando os contextos e percebendo o vazio em cada afirmação exaltada)

      Leiamos o livro, vejamos o filme, leiamos história, discutamos filosofia, pensemos a sociedade, convivamos com os diferentes, sejamos tolerantes, pratiquemos a empatia... Mas não paremos no tempo, tampouco utilizemos dos nossos problemas para atacar os outros. E aí, como você trata o Hitlerzinho que está dentro de você?


* Na fotografia uma imagem do filme. (selfie com Adolf) O próprio ator deu uma entrevista dizendo que ficou surpreso e assustado de como/quanta gente durante as gravações procuraram para dizer que o apoiavam, queria tirar fotos e etc.

quinta-feira, 26 de maio de 2016

Tive um pesadelo...


     No pesadelo eu estava em um país onde mulheres eram estupradas por dezenas de homens, isso era exibido nas redes sociais e o machismo era tão gritante que a própria mídia falava em suposto assédio. Havia quem tentasse explicar a situação pela roupa que a vítima usava. Alías roupa era assunto religioso. Algumas marcas não deveriam ser compradas pois eram do demônio. (C&A).

     Nesse lugar, Chico Buarque era ofendido na rua e Alexandre Frota era recebido pelo ministro da educação para dar conselhos. Lá o transporte era muito poluente, motivo de brigas e mortes. Matava mais do que assaltos, mas ninguém ligava. A única causa de polícia nesse aspecto eram os ubers. Afinal, os taxistas espancavam estes, pois eram “ilegais” e ainda prestavam um serviço muito melhor que eles.

     Os mesmos taxistas que espancavam o motorista do Uber, desrespeitavam as leis de trânsito e constantemente embriagados, entre um ou outro abuso as passageiras, diziam que a solução para acabar com a violência era matar todos os bandidos. (entrar nas vilas matando os neguinhos). A polícia as vezes fazia isso. Nesse momento o Estado aparecia e diziam para estes, que eles eram heróis. A população então vibrava.

     As coisas todas eram resolvidas desta maneira. Intolerância. As redes sociais eram arenas de batalhas. Mas sempre havia juízes para irem lá e, através das suas sentenças determinarem, sem leitura ou conhecimento de causa, o processo e os culpados.

     A política era sempre resolvida em escutas e delações premiadas. Todos os políticos eram acusados de serem corruptos. Nem todos eram, mas os eleitores, quase todos também corruptos, acreditavam ser mais fácil reproduzir este discurso.

     O presidente era um senhor, já idoso, homem branco. Todos do seu mandato eram assim. Seu lema era uma frase do século XIX, inspirada pelo movimento positivista e adotada por militares na época da política café com leite.

     Discutir política em sala de aula era quase crime. Afinal, pensar era realmente uma tarefa muito perigosa. As escolas lá, por sinal, não tinham professores. Eles não recebiam salários e quem ocupava as escolas eram os estudantes.

     A cultura não era entendida como algo importante. Como forma de protesto, muitos não assistiam filmes, não liam os livros ou escutavam a música. O principal meio de revolta era a greve do “pensar”.


Mas lá pelas tantas, infelizmente, acordei.


quarta-feira, 6 de abril de 2016

Para além do "Fora Dilma" ou "Não vai ter golpe"




Ninguém disse que seria fácil! 

penso que o regime que mais exige do cidadão é a democracia. Claro que ter que submeter as ordens de uma ditadura, independente da ideologia que ela represente é,  em minha opinião, horrível.  A desigualdade de uma sociedade monárquica estamental também. Viver como servo em um sistema feudal ou até escravo de um dia estado teocrático, nem se fala. Mas digo no sentido de autonomia,  de intelectualidade, de esforço e responsabilidade com o bem comum.  Obedecer é mais fácil. 

É como morar com os pais.  Podemos reclamar, não concordar, ficar bravo por discordar das regras e hábitos,  mas mesmo assim é mais fácil do que viver a liberdade do morar sozinho.  

Não estou julgando em termos de qualidade.  Não é isso. É responsabilidade.  Renato russo dizia que disciplina é liberdade. E para atingirmos a liberdade, precisamos passar pelo degrau da responsabilidade e da autonomia.  
Em um regime democrático, o cidadão é o ator principal.  Não é o líder político, o faraó, o rei... É você.  Sou eu. E aí?  Como estamos nos comportando?  

Acredito que a nossa novinha democracia (experiência de menos de 50 anos) tem exigido de nós mais do que temos oferecido.  Antes de dizer que o impeachment de uma presidenta resolveria ou até menos amenizaria  o problema do país, aconselho ler sobre o que é uma república. O que são os três poderes (executivo, legislativo e judiciário) e como eles se relacionam. 

Sugiro que estude o passado e o presente dos membros do legislativo e também a relação entre financiamento de campanha no Brasil ou o que é governo de coalisão (no Brasil hehe). 
Antes de mais uma vez, vulgarizarmos a discussão política, debatendo partidarismo ou expressando intolerância, alerto:

Não concordo ou engrosso o coro simplista e desesperado do "não vai ter golpe". Parte do que convencionamos chamar de esquerda e fecha os olhos pra situação do país.  Com isso não nego todas as melhorias que o governo dos últimos anos trouxe ao país.  (Que convenhamos não podemos dizer "governo do PT" mas que sim, o partido encabeçou uma série de mudanças significativas para o Brasil. Também não quero dizer que sou favorável ao "fora Dilma" como outro coro simplista, das pessoas que em sua maioria misturam toda sua raiva e descontentamento com discursos fracos que pensam ser culpa de uma pessoa ou partido tudo que acontece no Brasil.  Ou crêem em um processo conduzido por políticos corruptos e ineficientes.  
Então qual a solução? ??

Por mais cliché que possa parecer, ela está ao teu alcance.  Ela deve começar em nós.  Na nossa função de cidadão.  Em assumir nossa responsabilidade.  Em ler mais,  se informar mais,  fazer mais.  Em não colar na prova,  não furar a fila, separar o lixo, ser tolerante com as opiniões contrárias no Facebook, não sonegar o imposto.

Penso que na pós modernidade os grandes discursos ideológicos ou verdades absolutas todas já devia ter caído por terra. Mas penso que o Brasil é anacrônico.  Achamos que estamos na guerra fria. Falta engajamento e sobram xingamentos. 

Cuidado somente para não cair em outro pecado dos preguiçosos.  Dizer que nenhum ser humano presta.  Isso é tão burro quanto dizer que nenhum político presta.  Primeiro faça uma análise em você. Depois cobre do outro.  A mudança deve ser de dentro pra fora. Prontos? 


Enquanto isso o que nossos governantes tem feito nas câmaras, senado e gabinetes? e nós, o que temos feito além dos raivosos argumentos copiados e despejados nas redes sociais?... 


quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

Da Janela:




Da janela vejo o sol, a chuva a rua.
Ela, quase que totalmente nua.
Da janela eu me vejo, me percebo.
Sinto, não minto e existo.
É por ela que respiro, me inspiro e resisto.
Através dela que entro, que saio, que circulo.
Ela me faz ir além muro.


Mas não é poema, não é metáfora, é menos sério, é o que o pessoal de mais de 30 chama de real, verdade ou verídico. 

Tenho uma janela mágica.
Dela consigo ver de tudo.
E dela que recebo a energia, reflexões e alegrias.
Ela me traz o vento para arejar os pensamentos.
Por ela também entra o calor que me faz sentir acolhido.
Me ilumina através dos raios do sol.
É dela também que vejo a arvore, verde, sempre a me acenar.
Dela enxergo as gatas das vizinhas. Uma, felina, fica sempre deitada na janela.
Outra, as vezes se distrai e aparece seminua.
É da janela que entra os gritos das crianças que brincam de polícia e ladrão. Entendendo que ambos estão mais do mesmo lado que os adultos pensam.
É por ela também que vejo os vizinhos que cantam suas angustias.
O zelador que dança com a vassoura toda tarde.
Os aromas disparando as recordações.
A noite a lua aparece exatamente na minha janela.
É como se ela fosse um cinema onde cada dia eu pudesse assistir uma nova obra.
A minha janela me liga ao mundo.
(Tenho olhado muito para ela. Em busca de sinais, sentidos e saudades.)





ps: Na fotografia, minha janela. Companheira por inteira. 

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Vem pra Rua! & Caminhando e Cantando (na Neve)


A rua ao contrário da casa representa o público e não o privado. É nela que ficam mais explícitos os conceitos de liberdade, convivência, democracia e cidadania.

Um bom exercício de tolerância e diversidade.

O Brasil é muito rua! Da Matta fala do brasileiro da rua e da casa.
Acredito ser bastante importante seguir está vocação da rua. Não de cachorro de rua no sentido usado para referência a baixa auto estima, (à la Nelson Rodrigues), mas o cachorro de rua no sentido acolhedor, simpático, respeitador das normas de convivência, mas malandro no sentido incorporado de ser.

Brasil ao longo de sua história, embora tenha sido construído na rua, desdenha este espaço de civilidade. Tem algo de pobre, marginal, sujo e vagabundo na rua. Rua como algo inferior. Desde nosso período colonial, escravos na rua, nobres na casa grande. E assim prosseguimos no período imperial e da velha República.  A rua era habitada pelo pessoal dos cortiços, capoeiristas e demais excluídos ou minorias sociais.
Já nas décadas mais recentes graças a ditadura militar, rua era lugar de vagabundo que pensava e não concordava com o regime cruel.

Nesses últimos anos tenho percebido um movimento mais forte de ocupação dos espaços públicos.  Através das ciclovias, dos blocos e carnaval de rua, de manifestações...

Intervenções urbanas tem sido uma das minhas paixões. Grafite, músicos, atores e demais artistas de rua apresentam-se a céu aberto, entre esquinas e sinaleiras, nos presenteando e enfeitando as cidades. De acordo com o contexto que descrevia antes, estes também, no Brasil são menos reconhecido que em outros países.

Que o Brasil viva mais a rua. A rua tem muito a nos ensinar.  Tem coisas que não se aprende em casa. Só a rua ensina. 
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Semana passada uma reportagem me chamou atenção durante o jornal nacional.  Ela mostrava o resultado de uma nevasca muito forte que atingiu os Estados Unidos. Neve pelas ruas, por todos os lados. Dificultando o trânsito, sujando as calçadas, dando trabalho para sair de casa e, conforme a reportagem fez questão de explicitar, deixando tudo um caos.

Em meio às reclamações, caras fechadas, pessoas passando apressadas, uma criança munida de suas botas de borracha (?) fazia questão de passar por cima da neve acumulada na calçada.

Um sorriso estampava lhe o rosto. Acompanhando de sua mãe, que embora andasse de forma cuidadosa pela calçada, não deixou de dar a mão e andar ao lado de seu filho.
Em entrevista ela diz que mesmo demorando mais para chegar em casa, estava valendo a pena pela alegria do filho.  Que como uma típica mãe, replicava a felicidade do filho.

O que tem diferente entre o senhor que reclamava da neve e essa senhora? Ou entre a jovem de cara fechada que não olhou para a câmera e o menino que explorava a neve?
O que eles vêm!  A forma que enxergam as coisas, talvez.

A neve está ali, não é alucinação ou algo assim. Agora o que faremos com ela? Mesma situação para diferentes reações.  O que você tem feito com a neve que aparece em seu caminho? Como você tem vivenciado a rua da sua cidade?

Em tempos que pessoas enxergam salvação no Bolsonaro,  fico preocupado e ao mesmo tempo contente em querer ser alguém que enxergue as coisas como o guri estadunidense da neve.   (E aposto que se continuar pensando assim, jamais votaria em um Trump da vida).

* Na fotografia um grafite expondo uma das frases que mais gosto na MPB. Alucinação, de Belchior.