Dirigindo pela cidade tenho
a impressão que estamos todos apressados para chegar aonde não queremos. Parece
uma espécie de gincana onde quem perder menos é o campeão. Essa competição
motorizada que inclui violência, intolerância e barbárie, nos causa a impressão
que não há espaço para o trânsito dentro de uma civilidade.
Ao sair de casa com meu
cronômetro regressivo ligado, armado em meu tanque popular 1.0 me
deparo com um homem de meia idade atravessando a rua calmamente com seu
cachorro. Por um instinto de cuidado com o animal, resolvo parar e deixá-lo
atravessar com seu dono. Mas ao me ver eles param e com um olhar que emana a
mais profunda doçura acenam em sinal de agradecimento.
Aquele gesto tão simples,
quase imperceptível nas grandes questões cotidianas, me paralisa. Me faz querer
sua amizade. E se nós marcássemos um churrasco? Ou pelo menos um convite para
tomar um chopp? Poderíamos virar grandes amigos e sair para jogar bola com o
cachorro. E se todos vivêssemos em paz, sorrisos e agradecimentos, em um mundo
das delicadezas?
Em poucos segundos, enquanto essa história se
forma na minha cabeça ingênua, já sou jogado de volta a selva urbana por
buzinas que gritam atrás de mim. Já havia se formado uma fila de dois outros
automóveis impacientes. Acho que é impossível o amor no tráfego. Engato a
primeira e percebo que o mundo continua parado. As placas seguem não apontando
o destino.