domingo, 29 de janeiro de 2017

La la land: entre sonhos e realidades.

     


      La la land é um filme superestimado. Não digo isso por não ser o maior fã de musicais, mas por não acreditar que seja digno de tantas indicações ao Oscar. 

     Mesmo não sendo o maior admirador dos filmes que são contemplados com essa premiação, fiquei um pouco decepcionado com esse longa. Mas já adianto que o culpado não foi o filme!

     A questão não é o filme ser ruim. (Quem seria eu para classificar universalmente algo como Bom ou ruim). Mas a expectativa, como de costume, atrapalhou. 

     Tem um roteiro quase óbvio, até o final, que surpreende e traz o ponto alto do filme. A fotografia é excelente e ela traz uma cor realmente interessante. A atuação do Ryan Gosling é sensacional. A Emma Stone também está lá, com toda aquela sua beleza. 

     Destaco ainda a forma que o musical aborda o jazz. Traz uma visão poética e uma refrescância sobre esse gênero tão importante pra música e sociedade. As músicas que são interpretadas e a paixão com que o ritmo é abordado, realmente contagia.

     Mas a grande tônica é a relação de sonho e realidade. Isso o filme faz muito bem. Correr atrás dos sonhos ou viver a sua própria realidade?  E há como misturar os dois caminhos?  

     Entre expectativas,  decepções, música marcante, passinhos marcados e surpresas, o filme merece ser assistido. 

E fica a reflexão: sonhamos para poder suportar a realidade?  Os sonhos deixam a realidade mais decepcionante?  Deveríamos sonhar mais? Se contentar mais com a realidade?  


     De novo trago o Epicuro e o “quanto menos desejos, mas fácil a felicidade” e o Pessoa “Não sou nada, mas guardo em mim todos os sonhos do mundo”. Não necessariamente precisamos contrapô-los. E talvez essa medida do equilíbrio seja o melhor do La La Land!  Vamos sonhar uma nova realidade” Pés nos chãos mas cabeça nas nuvens. 

segunda-feira, 23 de janeiro de 2017

APAC: uma ilha de possibilidades.

     
                                    

     As tragédias ocorridas em Manaus e Roraima com a população carcerária, longe de ser um acidente, apenas escancaram ainda mais o caos que se encontra o sistema carcerário brasileiro. Um longo processo de ineficiência, abandono, desrespeito aos direitos humanos. As instituições prisionais já foram classificadas pela ONU e principais jornais do mundo como medievais. Não bastando esses recados, o país, ouvindo muitas vezes a parcela da mídia mais sensacionalista, população desinformada e indignada, e políticos que se aproveitam dessa situação, aumentou o número de prisões em mais de 200% nos últimos 10 anos. Estamos entre as maiores populações carcerárias do mundo. E somos a que mais cresce, atualmente.

     Brasil prende muito. Mas prende mal. Como disse o ministro da justiça. Nossa população carcerária é composta por um perfil claramente definido. 68% não possui ensino fundamental completo e 56% tem menos de 30 anos de idade. Entre os pobres, pretos da periferia, vemos é uma reprodução das desigualdades.

      As taxas de reincidência, embora careçam de um maior controle nos dados, como todos no que se refere a população de detentos no Brasil, giram em torno de 70%. Todos dados utilizados aqui podem ser acessados são fornecidos pelo Ministério da Justiça através do INFOPEN.  

     Não é de se surpreender quando se conhece as péssimas condições a que são submetidos os presos. Não estamos falando em luxo, mas em ter condições báscas para que o objetivo de ressocialização seja atendido. Caso contrário, os detentos regressam para a sociedade. Muito piores. Tento que se filiar a facções dentro do presídio e manter esse compromisso após a sua saída para manter-se a salvo.

     Em meio a esse mar de desesperança eis que temos uma ilha de possibilidade. Não que seja a solução, mas é uma excelente estratégia de transformação. E vem mostrando ótimos resultados: APAC.

     Surgida nos anos 1970 e reconhecida mundialmente a proposta ainda é pouco conhecida no Brasil. Criado por Mario Ottoboni, representante da pastoral carcerária, o método consiste na aplicação de doze passos: 1)participação da comunidade; 2) recuperando ajudando recuperando; 3) trabalho; 4) religião; 5) assistência jurídica; 6) assistência à saúde; 7) valorização humana; 8) a família; 9) o voluntário e sua formação; 10) Centro de Reintegração Social – CRS (O CRS possui três pavilhões destinados ao regime fechado, semi-aberto e aberto); 11) mérito do recuperando; 12) a Jornada de Libertação com Cristo.

     Enquanto os dados mostram um grau de reincidência de pelo menos 70% dos presos do sistema carcerário comum, nas APAC esse número cai para 10%. Para atingir essa ressocialização de 90% o modelo não utiliza policiais, armas ou qualquer tipo de violência. Os próprios presos, que lá são chamados de recuperandos, mantém todo o processo de limpeza, cuidados, alimentação e etc. É obrigatório o trabalho e estudo, o que compõe uma rígida rotina da manhã até a noite. Os apenados recebem ajuda dos voluntários que contribuem com atendimentos psicológicos, religiosos, esportivos e profissionais. Todo esse processo faz com que o custo de manter um condenado caia pela metade comparado ao sistema comum. Já há APACS espalhadas por várias cidades brasileiras.


     Estamos em fase de implementação da primeira no estado do Rio Grande do Sul, que irá ser na cidade de Canoas. Que vençamos o senso comum e jargões de ‘bandido bom é bandido morto’ ou ‘leva pra casa” e pensemos em soluções dentro da lei. Afinal, como diz a constituição, segurança pública é obrigação do estado mas dever do cidadão. Vamos contruir mais APACS? 


ps: Na foto, um corredor da APAC Barracão. (Local onde fiquei uma semana no regime fechado. E voltei transformado.). APAC não é a utopia, mas nos faz caminhar. 

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

2016...7

E não é que 2016 terminou? 

Dizem que o que é bom dura pouco. Prefiro pensar que os melhores momentos moram com a gente pra sempre. 

De toda a forma,não restam dúvidas que 2016 foi um ano marcante. Não somente no Brasil, mas em todo o mundo. Infelizmente o que mais chamou atenção foram aspectos negativos. Como de costume, nós e a mídia, valorizamos muito mais os aspectos menos felizes. (A única alegria da ovelha é ver a ovelha do lado ser morta pelo lobo?  Vale a reflexão). 

Mas enfim, assim como 1968, penso que 2016 também entrará para a história como um ano emblemático. Diferente do auge da guerra fria, endurecimento da ditadura no Brasil e América latina, movimentos de contestação e contra cultura na América e na Europa, tivemos outros momentos, mas também foram de utopias e barbáries. 

Aliás, muito do que as revoluções da época lutaram continua em jogo. Voltaram também algumas barbáries do século passado que acreditávamos não ter mais espaço. 

Ao invés de detalhar os aspectos como uma retrospectiva, prefiro pensar em 2017 já. Afinal, como historiador, enxergo melhor pelo retrovisor. Ainda estamos tentando entender 2016. Nada melhor que o tempo, para curar, doer, lembrar ou esquecer. Sem dúvida ajuda a entender. 

Esquecer talvez seja o melhor. Não com um tom trágico. Melancólico. Mas no sentido de arejar, mudar, sacudir e transformar. Black Mirror traz a medida adequada dessa reflexão no episódio do chip memória. De forma tão brilhante quanto Jorge Luis Borges, em seu conto, Funnes, el memorioso. Não conseguir esquecer é parar de pensar. E de sentir. 

Só espero que a troca do ano não seja uma mudança de Obama por Trump...

Afinal, 2017 chega tragicamente em praticamente todo o mundo. Precisamos aprender que não adianta mudar o ano se continuarmos iguais. 

Concordo com Drummond. 

Que esqueçamos nossos nós de 2016 (não no sentido de ignorar) mas no de transformar. E que venha 2017 e novos "nós". 





PS: Na imagem uma triste relação com a passagem de ano e a morte de um dos maiores intelectuais do nosso tempo. Nos deixa o pensador pós-moderno Zygmunt Bauman. Ele que nos trouxe a sociedade líquida e toda sua complexidade. Como historiador, não me surpreenderia se a época em que vivemos passe a ser chamada nos livros didáticos do futuro de "idade líquida". 

(Espero que a pós-modernidade de Obama não seja esquecida perante medievalismo de Trump).