As tragédias ocorridas em Manaus e
Roraima com a população carcerária, longe de ser um acidente, apenas escancaram
ainda mais o caos que se encontra o sistema carcerário brasileiro. Um longo
processo de ineficiência, abandono, desrespeito aos direitos humanos. As
instituições prisionais já foram classificadas pela ONU e principais jornais do
mundo como medievais. Não bastando esses recados, o país, ouvindo muitas vezes
a parcela da mídia mais sensacionalista, população desinformada e indignada, e
políticos que se aproveitam dessa situação, aumentou o número de prisões em mais
de 200% nos últimos 10 anos. Estamos entre as maiores populações carcerárias do
mundo. E somos a que mais cresce, atualmente.
Brasil prende muito. Mas prende
mal. Como disse o ministro da justiça. Nossa população carcerária é composta
por um perfil claramente definido. 68% não possui ensino fundamental completo e
56% tem menos de 30 anos de idade. Entre os pobres, pretos da periferia, vemos
é uma reprodução das desigualdades.
As taxas de reincidência, embora careçam de um
maior controle nos dados, como todos no que se refere a população de detentos
no Brasil, giram em torno de 70%. Todos dados utilizados aqui podem ser
acessados são fornecidos pelo Ministério da Justiça através do INFOPEN.
Não é de se surpreender quando se conhece
as péssimas condições a que são submetidos os presos. Não estamos falando em
luxo, mas em ter condições báscas para que o objetivo de ressocialização seja
atendido. Caso contrário, os detentos regressam para a sociedade. Muito piores.
Tento que se filiar a facções dentro do presídio e manter esse compromisso após
a sua saída para manter-se a salvo.
Em meio a esse mar de desesperança eis que
temos uma ilha de possibilidade. Não que seja a solução, mas é uma excelente
estratégia de transformação. E vem mostrando ótimos resultados: APAC.
Surgida nos anos 1970 e reconhecida
mundialmente a proposta ainda é pouco conhecida no Brasil. Criado por Mario
Ottoboni, representante da pastoral carcerária, o método consiste na aplicação
de doze passos: 1)participação da comunidade; 2) recuperando ajudando
recuperando; 3) trabalho; 4) religião; 5) assistência jurídica; 6) assistência
à saúde; 7) valorização humana; 8) a família; 9) o voluntário e sua formação;
10) Centro de Reintegração Social – CRS (O CRS possui três pavilhões destinados
ao regime fechado, semi-aberto e aberto); 11) mérito do recuperando; 12) a
Jornada de Libertação com Cristo.
Enquanto
os dados mostram um grau de reincidência de pelo menos 70% dos presos do
sistema carcerário comum, nas APAC esse número cai para 10%. Para atingir essa
ressocialização de 90% o modelo não utiliza policiais, armas ou qualquer tipo
de violência. Os próprios presos, que lá são chamados de recuperandos, mantém
todo o processo de limpeza, cuidados, alimentação e etc. É obrigatório o
trabalho e estudo, o que compõe uma rígida rotina da manhã até a noite. Os
apenados recebem ajuda dos voluntários que contribuem com atendimentos
psicológicos, religiosos, esportivos e profissionais. Todo esse processo faz
com que o custo de manter um condenado caia pela metade comparado ao sistema
comum. Já há APACS espalhadas por várias cidades brasileiras.
Estamos
em fase de implementação da primeira no estado do Rio Grande do Sul, que irá
ser na cidade de Canoas. Que vençamos o senso comum e jargões de ‘bandido bom é
bandido morto’ ou ‘leva pra casa” e pensemos em soluções dentro da lei. Afinal,
como diz a constituição, segurança pública é obrigação do estado mas dever do
cidadão. Vamos contruir mais APACS?
ps: Na foto, um corredor da APAC Barracão. (Local onde fiquei uma semana no regime fechado. E voltei transformado.). APAC não é a utopia, mas nos faz caminhar.