Abertura das Olimpíadas no Brasil
sem dúvida deu o que falar. Não somente em nosso país, mas figurou entre os
principais veículos de comunicação do mundo todo. Brasileiros comemorando,
sentindo-se orgulhosos e felizes. Alegria era marca das noticias, sempre
trazidas com um tom emocionante sobre todas as virtudes do Brasil e dos
brasileiros.
Há uma semana não seria possível perceber
isso. Mas e o que mudou? De um país corrupto, em crise, intolerante, onde nada
funciona e todos querendo se mudar para esse orgulho todo? Política do pão e
circo funciona desde a antiguidade. Nisso, Roma conseguiu se aproveitar como
ninguém. A questão é que não é somente negativa a política do pão e circo.
Afinal alimentar os que tem fome é algo bem importante. Nutrir o corpo e a
alma. Certamente estávamos com fome. O Brasileiro precisava disso. Passamos por
vexames esportivos, econômicos, políticos e sociais nos últimos anos.
A festa então
apaga tudo isso? De forma alguma. Ao menos não por mais de algumas horas. Mas a
questão é que a festa pode fazer notarmos que nem tudo são problemas. Nem tudo
está perdido. Ela ajuda a nos empoderarmos, sentirmos coragem e ânimo.
Autoestima é fundamental para qualquer processo de mudança.
Representatividade indígena, reconhecimento da cultura
negra, valorização da mulher, empatia com os refugiados e preocupação com problemas
ambientais! Importante tocas nestes pontos? Sem dúvida. Foi bonito? Foi. Bem
feito? Sim. Mas soou hipócrita? Claro!
Em um país que não conhece, reconhece ou valoriza seus povos
nativos. Que continua a ignorar a diversidade e riqueza das variadas culturas indígenas
brasileiras coloca-los como artistas principais e na realidade saber que eles
não são nem figurantes... triste. Será que eles servem só pra figuração em
nossas festas? Impressão minha ou ninguém foi contra cotas aos indígenas e negros para figuração na abertura das olimpíadas?
Ninguém foi contra os negros na dança de abertura? Aliás,
nada de violência né? Em um país extremamente preconceituoso na questão étnica que
disfarça seu racismo, foi legal fingir que o negro estava de fato incorporado a
sociedade brasileira. Ou será que lá, dançando, bem longe da gente é bonito.
Estavam a uma distancia segura.
Respeito a figura das mulheres! Certissimo. Mas define um
país onde a partir da cultura do estupro a culpa é sempre delas. Onde ainda
recebem consideravelmente menos que os homens, não possuem grande participação
política e para muitos ainda são alvos das piadas de inferioridade.
Aplaudimos entusiasticamente o grupo dos refugiados?
Exatamente como deveríamos. Mas e porque no dia a dia a gente tem medo destes
terroristas? Afinal eles vem tirar nossos empregos, não é? Fechamos as portas
para eles. Mas é que nas olimpiadas ficam só por um tempo e já vão embora. Para
onde? Isso não importa.
E por fim demos um recado ao mundo sobre os problemas
ambientais e a importância da sustentabilidade? Perfeito! Mas nós? Que não
conseguimos nem despoluir as lagoas onde haverá competição? Que mal conseguimos
separar o lixo?
Enfim, não quero ser o cara chato. Mas não quero ser o cara
bobo. Entre eles talvez tenha uma linha tênue onde nos deveríamos tentar nos
colocar. Nem ingênuos, tampouco neuróticos. Foi bonita, interessante, bem
feita, tocou em temas importantes. Mas agora vamos fazer por onde né? Para que
não seja só uma ficção.
* Na fotografia é Lea T, modelo transexual, trazendo os atletas brasileiros. Na abertura uma linda homenagem à todo um grupo. Grupo esse que nos outros dias é alvo de violência, transfobia, piadas, agressões, intolerância e e exclusão.